segunda-feira, 27 de abril de 2009

PESQUISA NA ESCOLA



Pesquisa na escola: da informação ao conhecimento
Heloisa Amaral


Segundo o dicionário Houaiss, a palavra "pesquisa" originou-se da palavra latina perquirère, que quer dizer buscar com cuidado, procurar por toda parte; informar-se, inquirir, perguntar; indagar profundamente, aprofundar. Para nossa reflexão, podemos completar dizendo que a atividade de pesquisar pode ser compreendida como a busca de informações para a construção e re-construção coletiva e individual dos conhecimentos, sejam aqueles conhecimentos mais próximos e imediatos, sejam aqueles mais amplos e gerais, ou ainda aqueles obtidos pela pesquisa científica em qualquer área do conhecimento.

Estamos afirmando, então, que o conhecimento não é uma invenção singular que a mente de cada indivíduo produz, mas uma re-construção pessoal do que a humanidade já sabe. Algumas vezes, pode até significar um salto para esse conhecimento universal, porém, na maior parte delas, significa um salto no crescimento da consciência do indivíduo. É esse crescimento da consciência individual o objetivo mais próximo das pesquisas escolares.

Diante desse objetivo, é preciso estabelecer que, para pesquisar, os alunos não podem apenas direcionar a busca para o pensamento alheio que será recolhido. Eles precisam elaborar e organizar as informações que pesquisam na escola para (num processo de síntese pessoal e partilha do que apreenderam), apropriar-se realmente delas, transformando-as em conhecimento. É o que podemos chamar de processo de compreensão ativa e responsiva: ativa porque ao ler, os alunos tomam iniciativas para a compreensão efetiva do que leem; responsiva, porque contém respostas a questões dele mesmo, que é quem busca, mas porque também supõe respostas dele, o buscador, ao texto que lhe traz respostas. Em suma, supõe múltiplos diálogos de quem aprende com o conhecimento buscado.


Até aqui, nada é novidade, os professores sabemos disso. Mas também sabemos que esse caminho não é apropriado pelos alunos com facilidade.


Se na pesquisa escolar nos frustramos com os resultados muitas vezes, também sabemos que crianças e jovens demonstram continuamente o crescimento de sua inteligência ao enfrentar desafios do cotidiano e possuem capacidade de aprender rápida e eficientemente o que as interessa. É só observá-las, por exemplo, quando tentam descobrir como funciona um novo aparelho que desejam utilizar. Nesses momentos, crianças e adolescentes procedem de modo autônomo, independente, desenvolvendo estratégias eficazes de busca para obter o conhecimento que desejam ter.


Ao procederem dessa forma, desenvolvem capacidades que se assemelham, de alguma forma, àquelas usadas por pesquisadores. Essas capacidades foram mobilizadas porque eles tinham um problema concreto, cuja solução lhes interessava: desejavam usar o aparelho, precisavam compreender como ele funciona e, para chegar onde queriam, levantaram várias questões sobre diferentes possibilidades de fazer o aparelho funcionar e experimentaram suas hipóteses sem se sentirem bloqueadas pelo medo de errar. Para descobrirem essas respostas, usaram alguns procedimentos práticos, como ligar e desligar o aparelho várias vezes, por exemplo. Os procedimentos que eles fazem (e que nós também fazemos, ou poderíamos fazer) para responder às questões que aparecem quando nos deparamos com novas situações cotidianas, costumam ser eficientes. Não que esses procedimentos possam ser classificados como procedimentos científicos ou mesmo escolares de pesquisa, mas as questões que deram origem a eles podem ser aproximadas das questões que mobilizam pesquisadores.


É aqui que precisamos fazer uma primeira parada em nossa reflexão: o primeiro passo é mobilizar as capacidades de busca. A mobilização depende do desejo de encontrar respostas para um problema, ou seja, o problema tem que ser próximo do universo dos alunos e interessá-los. Suponha que, em seu planejamento, existam temas sociais a serem aprendidos. Você deseja que os alunos saibam mais sobre questões sociais porque sabe que a consciência dessas questões pode melhorar a qualidade de vida da humanidade. Em vez de partir do alto, de temas amplos ou conceitos difíceis de serem entendidos, pode começar a refletir com eles sobre um problema próximo. Pode, por exemplo, propor que saibam mais sobre gravidez na adolescência e suas consequências. Se desejar que fique ainda mais próximo, procure circunscrever ainda mais esse tema: que saibam sobre a gravidez na adolescência no lugar onde vivem. Depois desse passo, você pode questionar aspectos mais amplos do desenvolvimento populacional do Brasil.
Provavelmente, o interesse será maior dessa maneira do que se o professor tivesse ido do amplo para o particular, o próximo. Partindo do que lhes é próximo, terão motivos para ler os textos necessários para se informar sobre o assunto, selecionar informações a partir de questões objetivas sobre o tema, sintetizar essas informações e discuti-las. Dessa maneira, estarão aplicando “ferramentas” já desenvolvidas em sua vida não escolar para construírem instrumentos de pesquisa e desenvolverem procedimentos de busca e seleção de informações de modo independente.


Para finalizar este texto, podemos refletir sobre uma idéia que João Wanderlei Geraldi coloca em seu livro Portos de Passagem:


“No processo de compreensão ativa e responsiva, a presença da fala do outro deflagra uma espécie de "inevitabilidade de busca de sentido": esta busca, por seu turno, deflagra que quem compreende se oriente para a enunciação do outro.”


Compreensão, para ele, é o encontro de sentido no que se lê e no que se ouve. Se eu não procurar sentido no que ouço ou leio, agirei como um robô quando estou ouvindo ou lendo; se eu procurar sentido, agirei de modo responsável, isto é, poderei assumir responsabilidade pessoal pelo que ouço ou leio e também falar com responsabilidade para os que me ouvem e lêem o que eu escrevo. Poderei responder verdadeiramente quando dialogo com pessoas no cotidiano, ou quando dialogo com os textos que leio. Essa atitude responsiva é fundamental para a superação da produção de textos/colagens de trechos de diversos outros textos lidos (e muitas vezes mal compreendidos).


Para chegar a esses resultados, em primeiro lugar, precisamos ajudar nossos alunos a preparar pequenos projetos de pesquisa, a partir de situações reais e próximas que despertem sua curiosidade; em segundo lugar, precisamos orientá-los para que escrevam os resultados de pesquisa sabendo sobre o que escreverão, com que finalidade, que tipo de leitores terão e onde publicarão seus textos. Precisamos, ainda, proporcionar condições facilitadoras da reflexão sobre seu texto, ajudando-os a verificar se ele expressa com clareza o que se quer dizer, se causará impacto no leitor, se vai convencer o interlocutor de que o ponto de vista sobre a pesquisa é relevante, se as reflexões feitas ou as explicações construídas são envolventes e agradáveis.





Referências:
GERALDI, J. W. Portos de Passagem. Ed. Martins Fontes, 1991.

BAGNO, M. Pesquisa na escola – o que é, como se faz. Ed. Loyola, 1998.



Disponível em http://escrevendo.cenpec.org.br/ecf/index.php?option=com_content&task=view&id=987&utm_source=Boletim&utm_medium=Boletim&utm_campaign=Boletim

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